Poema: Gosto da Cozinha, por Larissa Ferreira

Gosto da cozinha.
O que é cozinhar um prato
Sem cebolas e alhos?
Gosto de cortar cebolas.
O corte que arde os olhos
E as lágrimas escorrem.
Gosto da cozinha.
Ninguém percebe que
O que está sendo cortado
É na verdade minha alma.
O corte que arde os olhos
E as lágrimas escorrem.
Não sei o que foi cortado primeiro:
As cebolas ou a alma?
Mas as duas estão repicadas
Na bancada da cozinha,
Cortadas por mim.
Sim! Eu cortei minha própria alma.
As pessoas? Não. Não foram elas.
As pessoas desse mundo
Serão sempre imperfeitas e maldosas!
Eu aceitei cortar onde elas mandaram...
Cortei-me toda em brunoise
E continuo me cortando
Até não sobrar nada!
Nem um átomo, nem uma partícula subatômica!
Até virar um pó invisível
Que arde o olho
Que arderá o olho de outras almas.
E tudo será desintegrado
No ardor do sofrimento.
Até que as lágrimas lavem
As dores paralisantes.
E nasçam novas almas
De matéria impossível de cortar,
De matéria invisível
sem lágrimas.